quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Jornalista morre afogado - parada cardiorrespiratória foi causada por torrente de releases

Você chega na redação, maço de cigarros no bolso, pasta a tira colo, visão turva e rosto amassado e a primeira coisa que faz é ligar o computador.


A consulta ao Facebook é quase um tic nervoso e ocorre antes de qualquer coisa. Engraçado, mas a internet promove essa “proximidade distante” e, por mais que isso seja sabido, sentimos um enorme conforto ao constatar que todos estão juntos em algum lugar, mesmo que espectralmente – esse deve ser, também, o princípio da religião. Foda-se!

O próximo passo são os e-mails. “Crê em deus pai”, que desespero. Ser jornalista frente ao Outlook é constatar a morte iminente da profissão – ao menos a morte de tudo que é bom nela. Assessorias de imprensa parecem ter substituído o setor comercial das empresas, e, ao invés de pagarem pela publicidade, acreditam que podem nos fazer de idiotas colocando uma garotinha de 19 anos ligando e perguntando, com a maior inocência do mundo, se recebemos o release do revolucionário suco de tomates que rejuvenesce a pele. Vocês vão publicar?, questiona a menina que, pela voz, imagino com duas maria-chiquinhas, chupando pirulito. Sinceramente, não sei o que responder. Normalmente me faço de desentendido e digo que “a pauta será analisada por nosso editor”. Vai o cacete! Já deletei essa porra!

Mas não para por aí! Ser jornalista hoje é ter o intelecto relacionado ao de uma abóbora – e não são as de Halloween, porque essas pelo menos têm “cara” – e eis que surgem os concursos jornalísticos, promovidos por empresas que resolvem premiar reportagens – porra, mas é óbvio – exaltando o ramo por elas desenvolvido. Trófeu joínha pra vocês!

Nesse momento o jornalista já fumou quatro cigarros, entornou litros de café e pensou em suicídio – ou morar num lugar tranquilo, no interior (que dá basicamente na mesma) – umas quinze vezes.

O Facebook continua ali, em uma das abas do Google Chrome. De minuto em minuto o jornalista dá uma olhadinha – uma maneira sutil de pedir socorro é postar e compartilhar centenas de inutilidades; algo como jogar uma isca para ver quem se interessa para uma conversa que, por fim, será composta por tópicos sobre a agonia de trabalhar.


Tudo segue e, BINGO!, você ganha um carro pelo celular. “Envie uma mensagem para...”. O telefone toca e: “vocês vão mandar alguém para cobrir a posse do sub-vice-tesoureiro da presidência de sei lá que porra de empresa é essa!? Não, não iremos, estamos em fechamento de edição! Outro cigarro. Outro café. Toma água. Lava as mãos. Respira fundo... Um dia de cada vez!, o lema de oito em cada dez jornalistas, tanto no AA, quanto na redação.

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